2024/03/13

Prefácio à primeira edição de “Silogística: introdução à lógica categórica”.


Prefácio à primeira edição de “Silogística: introdução à lógica categórica”.

Curitiba: Carlos Magno Corrêa Dias, 2000.
ISBN 85-900661-5-0.


Ao se analisar o desenvolvimento histórico da lógica matemática é possível considerá-lo como resultante da convergência de quatro linhas de pensamento mais ou menos específicas. Tais linhas seriam: a lógica antiga, com sua origem em Aristóteles; a concepção de uma linguagem completa e automática para a argumentação; os progressos em álgebra e geometria evidenciados a partir de 1825; e, a ideia de que existem partes da matemática que são cadeias de argumentações que se conformam às regras da lógica em termos dedutivos.

Contudo, em particular, sendo necessário evidenciar ou distinguir em Aristóteles alguns aspectos (dentre outros) de seu pensamento a respeito da lógica, certamente, deveriam ser levados em conta: as discussões sobre a linguagem comum, principalmente no que concerne aos diferentes gêneros de palavras e as correspondentes conexões com as possíveis ordens de existência; um grupo de ensinamentos sobre o método científico e sobre como a investigação das ciências naturais pode determinar o aumento do conhecimento das leis físicas; um conjunto de sugestões sobre a arte da argumentação; uma série de ponderações sobre a correta organização de um sistema na ciência matemática; e, uma teoria sobre a forma de argumentação certa.

Ademais, quando se refere à lógica antiga (ou lógica comum, ou lógica de Aristóteles) está-se levando em conta a última das teorias anteriormente mencionadas. Inquestionavelmente, um tal aspecto da obra de Aristóteles sobre lógica não somente dá origem à lógica como, também, é notória a sua importância para o primeiro desenvolvimento da lógica matemática.

Assim, observe-se, deixando de lado os demais aspectos já pautados sobre a lógica de Aristóteles, que o presente livro tem por principal objetivo introduzir, de forma objetiva, porém com determinado grau de aprofundamento, a silogística de Aristóteles.

A teoria do silogismo de Aristóteles, que bem pode ser tomada como o núcleo da lógica tradicional ou antiga, constitui o primeiro sistema formal de que se tem conhecimento, sendo composto de uma teoria das implicações silogísticas. Uma implicação silogística é uma implicação com dois e somente dois antecedentes e um consequente, sendo tanto os antecedentes quanto o consequente enunciados categóricos. Em sua silogística, Aristóteles objetivou proporcionar uma relação completa e detalhada das diferentes formas possíveis de silogismos e um corpo completo de regras para comprovar a validade de qualquer silogismo dado.

Muito embora, na atualidade, geralmente se interprete a silogística de Aristóteles como um fragmento da teoria da quantificação em lógica formal, sua importância para o desenvolvimento ulterior da lógica matemática é inegável, sendo antes imprescindível. Hodiernamente (levando-se em conta determinadas interpretações e simplificações), é possível traduzir a lógica dos silogismos em uma teoria de primeira ordem, de maneira a reproduzir, formalmente, muitas das próprias derivações inseridas no pensamento de Aristóteles.

O propósito desse livro, então, é apresentar, de forma a mais clara possível, uma exposição concisa sobre a silogística, bem como, sobre alguns dos elementos a ela associados; dado que julga-se interessante apresentar a lógica dos silogismos a todo aquele que pretende introduzir-se no estudo da lógica formal.

Todavia, é lícito observar que, em decorrência das múltiplas implicações que envolvem os raciocínios silogísticos, o leitor não encontrará nesse trabalho extensas considerações relacionadas com a correspondente teoria, senão uma visão panorâmica da mesma acrescida, porém, de algumas ponderações particulares que possam constituir contributo básico para aqueles iniciantes que, por motivos os mais diversos, se obrigam a estudar a lógica matemática.

Os limites a que se sujeitam essa obra obrigam a apresentar o respectivo conteúdo de maneira que tanto a leitura resulte menos árdua quanto que a compreensão seja facilitada. Assim, aponha-se que o leitor desse livro, seja ele estudante ou professor, ou mesmo leigo, verificará que não se pressupõe um nível de conhecimento prévio em lógica matemática. O material poderá ser visto, com proveito, por todo aquele leitor que deseje se iniciar na silogística de Aristóteles, sem, contudo, pretender uma especialização nesse campo.

No que diz respeito à linguagem empregada na correspondente exposição do assunto, procurou-se, na medida do possível, utilizar a mais clara possível para não dificultar a compreensão das ideias com desnecessários tecnicismos. Contudo, esses últimos somente foram introduzidos quando assim o requeria a matéria abordada.

Conquanto toda ciência tenda, em seu próprio desenvolvimento, a incluir um número cada vez maior de ideias de progressiva complexidade - não estando a lógica matemática imune a essa tendência, espera-se não ter apresentado algo que fuja à compreensão. É claro, que em determinados pontos, entretanto, será necessária uma reflexão por parte do leitor. Porém, para a compreensão do conteúdo desse livro não se requer conhecimento prévio especial de lógica, nem tão pouco uma preparação matemática de nível superior.

A despeito, porém, das considerações precedentes, deve-se observar que, para efeito da exposição sobre o desenvolvimento do tema desse livro, optou-se por adotar uma subdivisão em dez capítulos.

Nesse sentido, então, de forma geral e compendiada, leva-se em conta, no Capítulo I (Prolegômenos às Origens da Lógica), um relato condensado sobre a história das origens da lógica matemática. Saliente-se, a propósito, que as correspondentes ponderações não partem de qualquer ponto de vista assumido. Apenas buscou-se descrever, o mais objetivamente possível, alguns fatos sobre os primórdios da referida história. Procurou-se, também e entretanto, relegar a um segundo plano e, ao máximo, quaisquer simpatias ou antipatias pessoais.

Aponha-se, no entanto, que a lógica matemática tanto quanto a matemática constituem uma aventura no mundo das ideias e a história dessas duas ciências revela, por sua vez, os pensamentos mais fantásticos de inúmeras gerações. Embora seu estudo envolva não poucas dificuldades, é, todavia, deveras esclarecedor.

Concluída a exposição pretendida no primeiro capítulo, onde se esboça o desenvolvimento de algumas ideias principais e minimiza-se as referências a outros tantos desenvolvimentos, apresentam-se, no Capítulo II e no Capítulo III considerações gerais sobre a matemática e a lógica, respectivamente, em Platão e em Aristóteles.

Já no Capítulo IV (Preliminares sobre Argumentos) apresentam-se algumas ponderações, muito particulares, a respeito de argumentos dedutivos e inferências.

Em seguida, no Capítulo V (Proposições ou Enunciados Categóricos) são definidas as proposições categóricas, procurando distinguí-las dos demais tipos de proposições. Evidenciam-se, então, as denominadas formas típicas de proposições categóricas, classificando-as segundo a quantidade e a qualidade.

Como os enunciados categó­ricos são asserções sobre conjuntos e de relações entre conjuntos, os termos sujeito e predicado são considerados como conjuntos. Mas, na época de Aristóteles conjuntos eram tomados como coleções de coisas com as mesmas características; não se aventando a possibilidade da existência de conjuntos vazios. Contudo, deve-se levar em conta a possibilidade (não remota) de alguns de tais conjuntos virem a ser vazios. Assim, ainda no capítulo anterior, faz-se a distinção entre o que se arbitrou chamar de interpretação existencial e interpretação hipotética.

Também, no Capítulo V, apresentam-se observações sobre os termos contraditórios, contrários, subcontrários e subalternos, bem como, sobre as correspondentes relações entre os mesmos. Ou seja, faz-se uma exposição sobre o chamado quadro de oposições de Aristóteles, evidenciando-se as dife­renças existentes entre a quali­dade e a quanti­dade (ou ambas) das proposições categóricas.

Como é possível representar as proposições categóricas através dos diagramas de Venn, no Capítulo VI (Diagramas de Venn e Enunciados Categóricos) assentam-se considerações sobre como proceder para efetivar a representação das proposições em questão através dos mencionados diagramas. Levam-se em conta, também, algumas considerações sobre a interpretação booleana dos enunciados categóricos de forma típica.

De forma assaz simplificada, são apresentadas no Capítulo VII (Cálculo dos Predicados e Proposições Categóricas) considerações gerais sobre o cálculo dos predicados em lógica matemática. Além do que, também, compendiadamente, evidencia-se a maneira pela qual é possível traduzir a lógica dos enunciados categóricos em uma teoria de primeira ordem. Em tal capítulo definem-se funções proposicionais e conjuntos-verdade de funções proposicionais; bem como, apresentam-se observações a respeito das operações lógicas sobre tais funções.

Ainda, no Capítulo VII, aborda-se a teoria da quantificação, onde são definidos os quantificadores universal e existencial e apresentadas observações relacionadas aos mesmos.

No Capítulo VIII (Regras de Inferência), faz-se uma exposição bastante geral sobre os denominados argumentos dedutivos. Inicia-se o capítulo revendo uma série de considerações sobre a validade e os critérios de verificação de validade de argumentos que têm sua existência no cálculo proposicional. Após uma tal exposição, complementam-se as regras de inferência do cálculo proposicional apresentando-se as principais regras de inferência que possibilitam analisar argumentos constituídos de enunciados quantificados; isso é, de argumentos próprios do cálculo dos predicados.

Aristóteles considerava a inferência silogística como fundamento do raciocínio, sendo uma de suas preocupações notórias aquela que diz respeito à classificação das formas legítimas do silogismo. Assim sendo, no Capítulo IX (Silogismos), faz-se uma caracterização geral dos silogismos e evidenciam-se aqueles silogismos tomados como válidos; além do que, na Seção 9.4 (Silogismos Válidos através de Diagramas de Venn) é levada em conta a forma pela qual é possível utilizar os diagramas de Venn para se mostrar a validade de um silogismo.

Algumas inferências são obtidas através do princípio aristotélico dictum de ommi et nullo (o que puder ser atribuído a um termo, pode igualmente ser atribuído a qualquer de suas partes. Outras inferências constituem em enunciar a própria premissa para se gerar uma inferência trivial (tautológica). Existem, pois, argu­mentos simples tais que de uma única premissa passa-se para uma conclusão que é conseqüência imediata da premissa aven­tada; constituindo o que se arbitra denominar inferências imediatas, tais como: conversão, conversão por limitação, obversão, e, contraposição. A tais inferências faz-se referência, também, no Capítulo IX.

No Capítulo X (Silogismos como Teoria Axiomática) encerra-se a exposição teórica do presente livro. Nesse capítulo apresentam-se algumas observações resumidas sobre determinados sistemas axiomáticos utilizados para a avaliação da legitimidade de silogismos, demonstrando-se a legitimidade de vários silogismos mediante a adoção de certos axiomas e regras.

Ao final dos Capítulos V ao X é dada uma coleção de exercícios que correspondem aos respectivos temas tratados em cada um de tais capítulos, sendo mais ou menos distribuídos em três categorias. Existem questões destinadas à simples fixação de conceitos. Seguem-se exercícios relativamente fáceis, que exigem provas de alguns teoremas mencionados nos correspondentes capítulos ou sua aplicação a determinadas situações. E, alguns exercícios que ou são mais difíceis ou exigem alguma reflexão prévia por parte do leitor.

Saliente-se, a propósito, que embora os exercícios não façam parte da exposição geral, a resolução dos mesmos contribuiria, muito especialmente, para a melhor compreensão do assunto abordado. As correspondentes soluções e/ou demonstrações solicitadas, bem como, algumas sugestões de consulta à bibliografia relacionada, podem ser encontradas em Problemas e Exercícios de Lógica, do mesmo autor desse livro, editado separadamente.

Por outro lado, ressalte-se que o presente livro inclui poucas referências bibliográficas dado que foi planejado para um leitor iniciante em assuntos relacionados à lógica, cuja motivação (ou necessidade), em geral, não é compatível com aquela daqueles que desejam se especializar no assunto. Contudo, o leitor mais curioso ou interessado, encontrará, disseminado ao longo de determinados capítulos, a referência a alguns livros que por sua vez podem remetê-lo a outros mais profundos. Não se apresenta uma bibliografia, porque, em geral, se tratando de uma introdução ao assunto, não será necessário, nessa fase inicial, aprofundar muitos dos aspectos abordados, a menos, é claro, que se pretenda um aprofundamento especial em lógica matemática. Nesse caso, o leitor poderá encontrar alguma orientação nas obras Compêndios de matemática e lógica matemática: uma abordagem extemporânea e Lógica matemática: introdução ao cálculo proposicional, também do mesmo autor.

A despeito, porém, do acima considerado, seria absurdo, num livro de introdução à silogística de Aristóteles, esperar que tudo o quanto se relacione com o tema tenha sido tratado especificamente. Espera-se, porém, que eventuais omissões não sejam prejudiciais ao estudo que de forma ampla é apresentado. Que o caráter introdutório desse trabalho não comprometa o seu entendimento. Além do mais, é preciso notar que essa obra, compendiada e introdutória, de modo algum pretende apresentar o assunto completamente, pois uma tal empresa estaria longe dos objetivos originalmente estabelecidos.

De forma geral, uma obra publicada é, até certo ponto, como um iceberg; porquanto, aquilo que é apresentado (por escolha do autor) pode constituir-se em apenas uma pequena fração do todo. Além do mais, nenhum livro surge sem que o autor dispense uma boa parcela de tempo, tenha um propósito estabelecido e sem que receba algum apoio daqueles que fazem parte de sua vida.

Assim, primeiramente, agradeço aos professores e estudiosos que procuram viabilizar (e instituir, na medida do possível) métodos e técnicas eficientes e eficazes de ensinar e/ou estudar (ou, ainda, em particular, difundir) tanto a lógica quanto a matemática.

Aos mestres que contribuem para o engajamento de seus alunos no campo da pesquisa científica, promovendo a constante (e incansável) busca da verdade e das solu­ções dos problemas do mundo em que vivemos, agradeço, em especial, o empenho e a seriedade.

Em particular, e muito especialmente, agradeço aos numerosos alunos com quem tive a oportunidade de trabalhar na PUCPR, no CEFETPR, e na UNICAMP, tanto em cursos de graduação quanto em cursos de pós-graduação. Porquanto, foi basicamente no processo ensino-aprendizagem desses educandos que surgiu a necessidade de se elaborar o correspondente trabalho.

Agradeço aos meus pais, José Waldetaro e Cirene Terezinha, por terem propi­ciado, apesar das dificuldades sempre presentes, o início de meus estudos, bem como, por sempre me incentivarem ao estudo e à aquisição do conhecimento. A eles devo a vida, a criação e as constantes orientações no caminho certo.

À minha esposa, Inês, agradeço a compreensão, a motivação e o incentivo com que acompanhou o desenvolvimento de cada uma das correspondentes fases do pre­sente trabalho; bem como, por toda a ajuda que, em maior ou menor grau, pude receber na leitura das correspondentes provas.

Às minhas filhas Mariana Carolina e Juliana Cecília agradeço pelas graciosas e constantes interrupções que se fizeram presentes durante todas as fases da elaboração desse trabalho. Que na época adequada possam elas se interessar (seriamente) por assuntos relacionados com a matemática e com a lógica.

De forma geral, agradeço, ainda, a todos as pessoas que, em nossas vidas, de uma forma ou de outra, direta ou indiretamente, consciente ou inconscientemente, se empenham por nós e torcem pelo nosso contínuo sucesso.

Porém, acima de tudo, agradeço à DEUS. Sem Sua proteção não estaria eu mais nesse mundo e esse trabalho não existiria.

Carlos Magno Corrêa Dias
Curitiba-PR, 01/10/2000