2013/04/30

Heranças Passadas Superestimam Resultados Futuros.


Em muitas das vezes nos deixamos hipnotizar pelas vitórias do passado e esquecemos que o presente nos exige novas conquistas que se não obtidas implicarão no reconhecimento dos fracassos no futuro.

Carlos Magno Corrêa Dias
30/04/2013

2013/04/29

Indiferença e Silêncio Confirmam Baixa Preocupação.


O Dia 28 de abril, DIA DA EDUCAÇÃO em nosso país, passou mais uma vez e uma única “palavra” foi pronunciada, um único evento foi realizado, atividade alguma foi desenvolvida (em muitas das Instituições de Ensino que se dizem de excelência no tocante à Educação). Apenas o costumeiro silêncio se fez presente. Não foram realizadas as esperadas atividades que poderiam promover a ampliação da necessária conscientização e possível intensificação de mobilização efetiva no sentido de garantir ações para dissipar os graves problemas que assolam a Educação brasileira. Vazio, descaso, indiferença, absoluta apatia e conveniência do não comprometimento foram percebidas naqueles locais do “mundo real”.

Talvez, não tenham sido permitidas quaisquer manifestações (naqueles locais onde a vacância sobre o tema reinou) tendo em vista, é claro, o fraco desenvolvimento da EDUCAÇÃO em nosso país, pois, embora seja notório no entendimento de qualquer cidadão, que estejamos caindo de todos os rankings que tratam da qualidade e da excelência na Educação, muito provavelmente, algumas instituições possam avaliar que fazer de conta que não são responsáveis pelo semelhante caos em que se encontra a Educação em nosso país é algum tipo de saída (aceitável).

Aproveitemos, então, o momento oportunizado pela data em referência para chamar a atenção sobre alguns números (assustadores) relacionados com a Educação no Brasil.

Segundo o Censo Demográfico de 2010 (realizado pelo IBGE) a população do Brasil era de 190.755.799 (cento e noventa milhões, setencentos e cinquenta e cinco mil, setecentos e noventa e nove) habitantes.

Mas, do total daquela enorme população de seres racionais e pensantes, tínhamos, absurdamente, que:
- quase 95 (noventa e cinco) milhões de Brasileiros NÃO TERMINOU OU SIMPLESMENTE NÃO CURSOU O ENSINO FUNDAMENTAL;
- aproximadamente 15 (quinze) milhões de Brasileiros eram ANALFABETOS ABSOLUTOS;
- mais de 120 (cento e vinte) milhões de Brasileiros foram qualificados como ANALFABETOS FUNCIONAIS; e,
- quase 175 (cento e setenta e cinco) milhões de Brasileiros NÃO POSSUIAM ENSINO SUPERIOR.

Tais números não mudaram. Pelo contrário, há informes que dão conta que existe um aumento progressivo daqueles resultados. Muito pouco foi realizado para alterar o quadro nestes últimos anos, pois outras são as preocupações que estão exigindo uma maior atenção (ao que se pode conjeturar).

O fato é que, mesmo diante destes números criminosos, a omissão (em dados setores do “mundo real”) se mostra a melhor saída. Seria colocar a cara para bater se alguma atitude (tanto naquele dia, como em outros anteriores) fosse promovida no sentido de promover as necessárias discussões e os urgentes trabalhos que deveriam estar sendo executados para sanarmos (ou ao menos amenizarmos) as inúmeras dificuldades quanto a termos uma Educação de qualidade para todos os Brasileiros. Apenas os protocolos são seguidos. O paradigma parece estar consolidado. A normalidade segue seu rumo como se tudo estivesse em conformidade com o aceitável. Lamentável. Absurdo. Triste.

Mas, completando aquele dia de elisões, alguém teria procurado me consolar dizendo: “Professor não se aborreça com semelhante situação, alguns até esqueceram da data (outros não sabiam mesmo), mas isto não é tão importante, pois dado o estado em que se encontra a Educação no nosso país não teríamos mesmo o que comemorar”.

Carlos Magno Corrêa Dias
29/04/2013
 

2013/04/27

Pífia Apropriação dos Benefícios Fiscais Também Condiciona Subdesenvolvimento.


Conforme fiz observar na palestra “Benefícios Fiscais Subjugados pelo Academismo”, é necessário chamarmos a atenção dos distintos “atores” da Sociedade, como um todo, para as questões no entorno da pouca utilização (ou desconhecimento) por parte da Academia (pública, em particular) sobre os Benefícios Fiscais existentes para a geração de produtos, processos ou serviços que objetivem o progresso de nossa Nação e a melhoria de vida da nossa População.

Tomando-se por base o último Relatório do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) sobre a aplicação da Lei do Bem, o Relatório datado de 2011, é possível constatar que o Brasil inova muito (muito) pouco, tem oitenta por cento de seus pesquisadores sediados (lotados convenientemente) ou nas Universidades ou em Setores Públicos (gerando quase três por cento da produção mundial de artigos científicos publicados em revistas especializadas), possui um elevado índice de investimento em pesquisa (um pouco mais de um por cento do PIB), tem um pífio (muito baixo) desenvolvimento de produtos, processos ou serviços e não possui um Política de Estado que condicione contrapartida com benefícios diretos para a Sociedade mediante a geração das correspondentes Patentes e Propriedades Intelectuais em geral.

Diante de um quadro tão contraditório, observo uma vez mais, é lamentável, então, que os Benefícios Fiscais da Lei do Bem (para considerar uma das várias possibilidades) sejam tão pouco utilizados (ou, em dada medida, subestimados). Como pontuado no meu artigo “Pesquisa Sem Patente e Sem PI é Fonte de Subdesenvolvimento”, uma possível resposta para semelhante desperdício seja a camisa de força que é imposta pela insana produção de artigos científicos sem a menor obrigatoriedade com a geração de Patentes e Propriedades Intelectuais. Pesquisa sem desenvolvimento de produtos, processos ou serviços orientados (ou condicionados) pela Inovação não tem sentido e não conduz ao desenvolvimento. Inovação obriga valor. As Patentes e Propriedades Intelectuais (em geral) saltam do intangível transformando-se em valor econômico e financeiro que passa a ser incorporado pelos Meios de Produção. Essa é uma nova ordem mundial (que o meio acadêmico parece não percebe). Mas, não percebe-la, ou ficar à sua margem, é garantir, inevitavelmente, e, talvez, irrevogavelmente, o fracasso institucional.

Porém os Incentivos Fiscais garantidos por leis nacionais são favorecidos aos empreendedores que se comprometam em ampliar o desenvolvimento e o progresso do país gerando, necessariamente, produtos, processos ou serviços condicionados pela Inovação. E este é, exatamente, o problema: não basta o artigo, o “papel”. Na maioria dos casos, para ter direito aos correspondentes Benefícios Fiscais os empreendedores devem comprovar o investimento em PDI para o MCTI, que avalia os projetos submetidos sob a ótica da Inovação.

Deve-se observar, entretanto, que concedidos os Benefícios Fiscais para a produção de produtos, serviços ou processos há, em conseqüência, a exigência da declaração do Imposto de Renda por lucro real. Mas, esta não tem sido a maior barreira para o acesso aos Benefícios Fiscais para a produção de Patentes e Propriedades Intelectuais. O maior empecilho, como já pontuado, é a forte exigência criada para a incessante publicação de artigos científicos em detrimento dos depósitos de pedidos de Patentes ou dos registros de Propriedade Intelectual.

Contudo, esta mentalidade, ou semelhante prática, tem contribuído para a estagnação do desenvolvimento do país em vários campos e, infelizmente, vem determinando, também, o retrocesso naquelas inúmeras áreas que se desenvolvem constante e continuamente em função da Inovação. Como faço observar, reverter semelhante situação, deve ser a nossa função enquanto formadores dos profissionais que vão gerir os destinos de nosso país no futuro próximo.

Carlos Magno Corrêa Dias
27/04/2013

2013/04/24

Ler é Prazer Apenas Superado pelo Escrever.


Em 23 de abril passado, comemoramos o Dia Internacional do Livro e o Dia do Autor, data, pelo que percebemos, com alguma natural estranheza, pouco conhecida ou não muito festejada (talvez).

Mas, seja como for, em particular, a data me faz recordar passagens importantes de minha existência no que concerne aos livros que li uma única vez, aos que li mais de uma vez, aos que não me permiti ler e aos muitos outros que ainda tenho a intenção de ler. Os livros possuem poderes que nos moldam e nos recriam como seres pensantes.

O Dia Mundial do Livro e do Direito de Autor foi criado na XXVIII Conferência Geral da UNESCO, ocorrida entre 25/10/1995 e 16/11/1995, objetivando a promover o prazer da leitura, a publicação de livros e a protecção dos direitos autorais. O dia 23 de abril foi escolhido haja vista ter sido (coincidentemente) a data de nascimento ou de falecimento de importantes escritores mundiais tais como Miguel de Cervantes Saavedra (29/09/1547-23/04/1616), William Shakespeare (23/04/1564-23/04/1616), Garcilaso de la Vega (12/04/1539-23/04/1616), Maurice Druon (23/04/1918-14/04/2009), Josep Pla (08/03/1897-23/04/1981) e Manuel Mejía Vallejo (23/04/1923-23/07/1998).

Mas, pessoalmente, a data é duplamente importante, pois além de apreciador da leitura de livros sou, também, um daqueles que têm o privilégio e a satisfação de poder escrever, editar e publicar livros.

Saudando, então, o Dia Internacional do Livro e do Autor, convido todos a ler os livros que já escrevi, que já ultrapassam os trinta títulos e que versam sobre temas como Lógica, Filosofia da Ciência, Literatura e Artes. Tais obras encontram-se depositadas em nossas Bibliotecas. Boa leitura.

Carlos Magno Corrêa Dias
24/04/2013

2013/04/21

Dos Valores, o Maior.


Defender a LIBERDADE sempre será o maior valor do homem civilizado.

Carlos Magno Corrêa Dias
21/04/2013


2013/04/18

“Brincando com as Palavras” no Dia Nacional do Livro Infantil.


Lembrando o Dia Nacional do Livro Infantil, comemorado em 18 de abril, a partir da Lei 10402/02, de 8 de janeiro de 2002, convido todos a lerem as obras: Contínuas possibilidades (2011, ISBN: 978-85-88925-13-7), Alegorias do pensar (2005, ISBN: 85-88925-11-7), Alçando vôo em rimas (2004,ISBN: 85-88925-07-9), Fantasias em Palavras (2002), ISBN: 85-88925-02-8), Primeiros Poemas: Brincando com as Palavras (2002, ISBN: 88925-01-X) e Primeiros Poemas (2002, ISBN: 85-900661-8-5). Boa leitura.

Carlos Magno Corrêa Dias
18/04/2013

2013/04/13

Necessária Suficiência Relacional.


Filosofar jamais será suficiente, mas, também, nunca deixará de ser necessário.

Carlos Magno Corrêa Dias

13/04/2013

2013/04/09

Filantropia Revertida em Júbilo.


Seja verdadeiramente caridoso e experimentará alegria jamais sentida.

Carlos Magno Corrêa Dias
09/04/2013

2013/04/08

Hipócrita Relação Censurável.


Basta um homem honesto para se identificar quando não há honestidade em dado meio. Contudo, não existindo tal homem honesto, o correspondente meio se desenvolve sem saber que existe a honestidade.

Carlos Magno Corrêa Dias
08/04/2013

2013/04/02

Simbiose Mantida para o Desenvolvimento da Ciência.


Partindo da convicção que Boécio (c. 480 - 525/26), Fibonacci (c. 1180 - 1250) e Regiomontano (1436 - 1476) são os três medievais que bem podem constituir uma tríade representativa da ciência (em geral) e da matemática (em particular) na Idade Média, no presente artigo é pretendido evidenciar, de forma estrita, a importância do primeiro dentre os três atores históricos como o “último romano e o primeiro escolástico” a manter a necessária simbiose entre as correspondentes eras para assegurar a continuidade do conhecimento científico.

Partindo-se do artigo “Boécio - Fibonacci - Regiomontano: Uma Tríade Representativa da Matemática na Idade Média”, que elaborei e publiquei há algum tempo passado, saliento que as ponderações sobre a “unidade trinária”, anteriormente considerada, é substituída, neste arrazoado, por uma exposição centrada em observações apenas sobre o primeiro daqueles medievais; mantendo-se, porém, a posição já defendida.

Como sempre salvaguardado, há de se salientar, uma vez mais, preliminarmente, que para o entendimento do desenvolvimento dos feitos da humanidade, ou para a distinção (avaliação) da evolução da cultura das civilizações, não devem ser considerados tão somente os fatores ligados a recursos técnicos ou a avanços na realidade física, mas, também, e principalmente, é aconselhável compreender (ou perceber) a mentalidade dos homens de cada período da história que promoveram eventuais transformações. E, neste sentido, os medievais se distinguiram notavelmente.

De forma geral, a “experiência” medieval salvou a cultura antiga. E é, justamente, devido ao trabalho de aprendizado elementar inserido na pedagogia medieval que atualmente, certamente, temos garantido diversos dos progressos e inovações mais espetaculares. O trabalho de preservação, de salvação da cultura antiga, desenvolvido por educadores medievais, acima de quaisquer outros pontos, conservou as sementes dos grandes progressos futuros. E, dentre estes educadores temos a ressaltar a figura brilhante de Boécio; sem o qual, muito provavelmente, a maior parte do conhecimento se teria perdido irremediavelmente.

Até o final do século XI verifica-se que os povos cristãos encontravam-se na maior desordem política, na recessão econômica, na falta de perspectivas e na ausência de progresso intelectual ou material. A Europa demorou muito a se recuperar da queda do império romano e das invasões bárbaras. O conhecimento científico era elementar, para não dizer inexistente. O ensino da “aritmética teórica” tinha sua principal fonte em trabalhos inspirados amplamente na Introductio arithmeticae, uma obra matemática de pouca qualidade e originalidade atribuída ao grego Nicômaco de Gerasa (c. 60 - c. 120), um neopitagórico que viveu não longe de Jerusalém. Porém, a aritmética prática consistia essencialmente no uso da numeração arcaica do povo romano tanto no modo de contar com os dedos quanto na prática de operações através de pedras ou de fichas nos velhos ábacos (também proveniente dos romanos).

Nesta escuridão quase total, por que considerar a importância de Boécio no desenvolvimento da ciência ou da matemática se a sua aritmética era aquela baseada na fraca obra de Nicômaco e a sua geometria continha nada mais que os enunciados do Livro I de Euclides (360 a.C - 295 a.C), com algumas proposições dos Livros III e IV, muitas aplicações numéricas relativas à simples determinação de áreas e alguns outros poucos assuntos? Muito simples. Os textos matemáticos do diplomata e filósofo Anício Mânlio Torquato Severino Boécio, que nasceu em Roma, discípulo da escola de Atenas, neoplatônico (pelo menos), descendente das nobres famílias dos Anícios e dos Torquatos, notoriamente versado na literatura e na ciência gregas, constituíram a fonte de autoridade no mundo ocidental durante mais de um milhar de anos. Por intermédio das obras matemáticas de Boécio a Europa medieval, ao passo que tomava conhecimento da vida intelectual do mundo antigo, aprendia tanto a geometria como a aritmética.

Além do mais, tais textos refletem as condições culturais da correspondente época. São de conteúdo elementar (no sentido estrito da palavra) e a sua própria sobrevivência, é provável, pode ter sido influenciada pela crença de que o autor morrera como mártir da fé católica. Boécio foi chamado “o último romano, o primeiro escolástico”. Cônsul de Teodorico (454 - 526), rei dos ostrogodos, Boécio foi assassinado sob a acusação de magia e de conspiração. Boécio é considerado um cristão e um “mártir da fé”.

Pondere-se que Boécio mesmo tendo sido muito estimado de Teodorico (que em 493 expulsara os hérulos de Itália) e tendo sido eleito cônsul, ainda muito jovem, foi um defensor acérrimo dos direitos dos camponeses contra os roubos e depredações dos funcionários públicos. Tal atitude lhe acarretou a acusação de conspirar juntamente com o imperador Justiniano (483 - 565) do oriente para libertar Roma do jugo do invasor. Condenado à morte, Boécio foi torturado no batistério da Igreja de Ticínio, sofrendo horrível suplício.

Enfatize-se, uma vez mais, que sob o ponto de vista estritamente matemático, tanto a Aritmética como a Ars Geometriae de Boécio são livros de pouco valor. Porém, durante vários séculos constituíram a base de todo o ensino matemático nas escolas das catedrais e dos conventos da Europa Ocidental. As obras matemáticas de Boécio, juntamente com os livros do romano Cassiodoro (490 - 566) e de Isidoro (570-636), bispo de Sevilha, foram consagrados ao quadrivium matemático (aritmética, geometria, música e astronomia), tendo sido consideradas obras modelo.

As obras de Boécio podem ser divididas em três grupos: no primeiro grupo, tem-se uma coleção de trabalhos relacionados com as artes liberais. Tem-se, então, traduções de Aristóteles (384 a.C - 322 a.C) tais como Categorias, De Interpretatione, Primeiros e Segundos Analíticos, Argumentos sofísticos; comentários sobre Isagoge de Porfírio, as Categorias e De Interpretatione de Aristóteles, os Tópicos de Cícero, bem como, composições mais ou menos pessoais (Tratados de Lógica, De Arithmetica, De Musica).

No que concerne ao segundo grupo de tais obras distinguem-se cinco opúsculos teológicos (Contra Eutíquio e Nestório, A fé católica, Da Trindade, Os sete problemas (De hebdomadibus), Se o Pai, o Filho e o Espírito Santo são predicados da deidade segundo a substância?). Tais opúsculos haverão de desfrutar, em meio aos mestres de teologia, grande crédito e prestígio.

Contudo, foi na prisão que Boécio escreveu sua obra mais notável, a Consolidação da Filosofia. Esse ensaio, escrito em prosa e verso, alternados, foi elaborado enquanto, na prisão, esperava a morte. Em tal trabalho Boécio discute a responsabilidade moral à luz da filosofia aristotélica e platônica. A Consolidação da Filosofia, do século IX ao século XV, foi uma das obras mais apreciadas e mais freqüentemente comentadas, fornecendo, por sua conta, inspiração e apoio a muitas gerações de filósofos.

Os livros citados e grande número de obras dos filósofos gregos que Boécio traduziu, deram, na Idade Média, grande fama ao célebre romano, fama que, a partir do século XIII, com a aparição de outros autores mais notáveis, foi-se, contudo, extinguindo pouco a pouco, ficando Boécio conhecido, principalmente, pela sua Consolidação da Filosofia, que Alfredo (849 - 901), o Grande, o mais ilustre dos reis anglo-saxões, que fundou a Universidade de Oxford, fez traduzir.

Deixando de lado, porém, tudo quanto o romano Boécio tenha escrito sobre outros temas, concentre-se em ressaltar, por um lado, a sua tarefa pedagógica e, por outro, as suas particulares contribuições à matemática.

Observe, primeiramente, que tendo Boécio estudado por muitos anos em Atenas (na Academia, fechada por Justiniano em 529) as ciências, a literatura e a filosofia gregas, este adquiriu um profundo conhecimento da cultura clássica. Em meio à barbárie dominante, Boécio realizou (até certo ponto e na medida do possível) tanto a salvação quanto a transmissão da cultura antiga para os novos ocupantes do Ocidente; e nisto consiste, talvez, a maior e melhor contribuição de Boécio para o futuro.

Devido à aguda visão de Boécio, este percebeu a gravidade do momento histórico de sua época e, muito provavelmente, sem a sua intervenção poderia ter ocorrido um total desaparecimento da cultura que tivera suas origens na Grécia e em Roma e que modelara o Ocidente.

Assim, quando Boécio volta à Itália, passa a utilizar sua influência, originada pelos cargos que lhe são confiados pelo rei Teodorico, para, efetivamente, exercer sua importante tarefa pedagógica; qual seja: “transmitir o saber clássico aos bárbaros”.

Pode parecer, de forma equivocada, que o trabalho pedagógico de Boécio (um homem culto, educado na Grécia, vivendo em meio a bárbaros, um católico em meio a arianos, e, acima de tudo, um romano em meio a ostrogodos) encerra pouca importância. Contudo, embora, em muitas das vezes, o trabalho de Boécio de selecionar, traduzir e resumir parte da cultura da Antigüidade seja classificado como “simples, discreto e pouco original”, reveste-se o mesmo de extraordinária importância para o futuro, dado que a matemática e a filosofia preservaram-se (é certo que precariamente) no Ocidente e mantiveram-se até que, séculos depois, puderam atingir revigorado impulso, passando a desenvolver-se mais e mais.

Acrescente-se, também, que Boécio (homem de ideais elevados e de integridade rígida) tinha a ambição de traduzir todas as obras de Platão (428/427 a.C - 348/347 a.C) e de Aristóteles; contudo, um tal projeto foi interrompido por sua trágica morte. A maioria dos comentadores são de opinião que Boécio já teria garantido um lugar de destaque na história somente com seu trabalho de tradutor e comentarista. Boécio, “o primeiro escolástico”, estabeleceu a ponte entre a cultura grega antiga e a Idade Média e foi o fundador da Escolástica. Durante séculos nada se conheceu no Ocidente sobre Aristóteles ou sobre a geometria a não ser o “pouco” que Boécio traduziu, comentou ou produziu.

É de se ressaltar, ainda, quanto à preocupação de Boécio com o desaparecimento do esplendor da cultura grega, a sentença que se encontra no começo do livro II do Ars Geometriae (obra onde se resume em opúsculo a geometria de Euclides), qual seja: “apesar de expressos de maneira resumida, pelo menos estão aqui reafirmados”, ou em outra tradução: “apresentei-vos a Geometria de modo sucinto e facilitado, mas a apresentei”. Uma tal sentença bem pode sintetizar todo o projeto de salvação cultural boeciano:

É, também, interessante ressaltar a curiosa passagem do Ars Geometriae onde Boécio pede “licença” aos seus leitores (ostrogodos) para fazer demonstrações de teoremas a fim de que estes não permanecessem na mais total ignorância: “que se saiba pelo menos o que é demonstrar um teorema e que isso é belo, importante e formativo”. Para tanto, demonstrou apenas três: as três primeiras proposições do livro I de Euclides. E, também, nesta atitude são preservadas as sementes que algum dia haveriam de germinar.

A importância de Boécio na história da matemática está, portanto, mais no fato de seus livros de geometria e aritmética terem sido adotados, por muitos séculos, nas escolas monásticas, do que por conter contribuições efetivas ao edifício matemático. Embora fracos, esses trabalhos acabaram se constituindo no sumo do conhecimento matemático, o que ilustra, também, bem o quanto o conhecimento matemático se tornou “insignificante” na Baixa Idade Média.

A Geometria de Boécio (em tradução latina), como precedentemente observado, se resume nos enunciados das proposições do Livro I e em poucas proposições escolhidas dos Livros III e IV dos Os Elementos de Euclides, juntamente com algumas aplicações à mensuração. A sua Aritmética se baseava na de Nicômaco, escrita quatro séculos antes, um trabalho enfadonho e meio místico, embora tivesse desfrutado de alto prestígio. Contudo, cabe insistir: graças a esses trabalhos elementares a matemática preservou-se no ocidente e pôde manter-se até o século X, quando recebe novo impulso e, a partir dos séculos seguintes, desenvolve-se de forma surpreendente.

Acrescente, a propósito, que a Introdução à aritmética de Nicômaco, que serviu de modelo para imitadores e comentadores, não era nem um tratado sobre computações nem sobre álgebra, mas, claramente, um manual dos elementos de matemática essenciais à compreensão da filosofia pitagórica e platônica. Entre aqueles que se fundamentaram na referida obra os mais conhecidos foram Teon de Smirna (viveu por volta de 125), que escreveu sua Exposito em grego e o próprio Boécio, que escreveu sua Aritmética muito depois em latim. A Expositio trata de uma exposição de questões matemáticas úteis à compreensão de Platão e, por sua vez, a Aritmética de Boécio nada tem de original (enquanto obra matemática); é, na verdade, quase uma tradução da obra mais antiga de Nicômaco.

É sempre oportuno lembrar, todavia, que na Grécia antiga a palavra aritmética significava “teoria dos números”, não “computação” (infelizmente). Acrescente que a aritmética grega tinha mais em comum com a filosofia que com o que, atualmente, chamamos de matemática. Porém a aritmética grega teve, em conseqüência, importante papel no neoplatonismo durante a Segunda Idade Alexandrina.

Apresentadas as resumidas observações anteriores sobre o propósito pedagógico de Boécio, reporte-se, entretanto e especificamente, às contribuições de Boécio à matemática; onde, em particular, leva-se em conta alguns pontos sobre a função de Boécio quanto às origens do Sistema Decimal de Numeração.

Há de se observar, primeiramente, que o ábaco sofreu diversos aperfeiçoamentos, contudo, certamente, o principal foi aquele em que foram introduzidas em cada ranhura ou arame de marcas as esferas com sinais diferentes, chamados ápices, que correspondiam aos algarismos gobar, usados pelos árabes de Espanha, mas sem o zero (o qual com o ábaco não era necessário). Muitos historiadores insistem em atribuir este aperfeiçoamento a Boécio (embora, pondere-se, historiadores existem que o atribuam a outros autores).

É sabido que Pitágoras (c. 571 a.C./570 a.C - c. 497 a.C./496 a.C.), segundo Proclo (410 - 485) dividia a ciência matemática em quatro partes; quais sejam: duas correspondentes às quantidades discretas (consideradas em si mesmas ou em relação com outras) e outras duas correspondendo às quantidades contínuas (no estado de repouso em movimento). A Boécio é atribuída a divisão da matemática em aritmética, música, geometria e astronomia. A referida divisão ficou conhecida com o nome de quadrivium, conforme a designou Boécio, sendo seguida durante toda a Idade Média. Um tal quadrívio constituiu, durante muito tempo, um curso de estudos necessário e suficiente para uma instrução liberal. Veja-se, entretanto, que Boécio, quanto ao quadrívio, cita como fonte fundamental da sua informação em muitos pontos de doutrina, a Arquitas (428 a.C. - 365 a.C.), que se supõe seja o célebre geômetra, mestre de Platão.

Tendo sido Boécio muito habilidoso na mecânica e na gnomônica tornou público o uso dos quadrantes solares, dos relógios de água, dos relógios hidráulicos. Conta-se que, por ordem de Teodorico, Boécio teria construído para o rei dos burgundos dois relógios, um solar, outro hidráulico. Nas palavras de Teodorico estes relógios teriam sido construídos “a fim de que os estrangeiros saibam que temos aqui uma nobreza tão instruída como o são aqueles que nas suas nações fazem profissão de saber”.

Outra contribuição de Boécio diz respeito às tábuas de duas entradas em uso atualmente; as quais, segundo se sabe, não existem indícios de que os gregos as conheciam. Na Geometria de Boécio se encontra uma tábua de multiplicação de dupla entrada em substituição às tabelas de uso freqüente na correspondente época.

É importante ressaltar que em alguns casos a obra matemática de Boécio, embora muito usada em escolas monásticas medievais, pode ter sofrido interpolações posteriores, por isso é difícil determinar precisamente o que se deve de fato ao próprio Boécio. Contudo, é claro que o autor se preocupava principalmente com dois aspectos da matemática: sua relação com a filosofia e sua aplicabilidade a problemas de mensuração. Da matemática como estrutura lógica há poucos traços, embora tenha dado, também, importante contribuição à própria lógica enquanto tal. Há alguma presunção, também, que em Boécio haveria a origem pitagórica do sistema decimal de numeração.

Em certos manuscritos de Boécio aparecem formas numerais, ou ápices, semelhantes, para uso no ábaco. Entretanto, os ápices atribuídos a Boécio foram criações próprias ou, de outro lado, foram interpolações posteriores de seus seguidores? De qualquer forma, porém, há de se salientar: a situação quanto à introdução dos numerais na Europa é mais ou menos tão confusa quanto a da invenção do sistema talvez meio milênio antes. Além disso, não se sabe se houve um uso continuado dos novos numerais na Europa a partir de Boécio. De certo mesmo é que somente no século treze é que o sistema indo-arábico ficou definitivamente estabelecido na Europa, e isto não foi, certamente, realização de um único homem, mas de vários, em distintos períodos.

Partindo-se da suposição que os indianos tenham inventado o nosso sistema de numeração, aos neopitagóricos caberia o acolhimento das idéias correspondentes (e, afirme-se, foi notória a propensão dos neopitagóricos para acolher as idéias brahmânicas). Mas Boécio foi o último dos neopitagóricos. De Boécio, outros teriam aprendido o correspondente sistema que foi difundido em toda a Europa, sem exclusão da Espanha. E, na Espanha, os árabes descobrem o referido sistema, apoderando-se dele convenientemente.

Portanto, poder-se-ia afirmar que, embora Boécio não tenha inventado o sistema decimal de numeração, foi o primeiro geômetra que, no ocidente, se ocupou dos sinais numerais, os quais só muitos séculos mais tarde a Europa deveria adotar, pela propaganda dum modesto mercador de Pisa: o formidável Leonardo Fibonacci.

A obra matemática de Boécio conduz a um novo horizonte na história da matemática, onde, no declínio das matemáticas gregas, começava a formar-se uma nova escola de matemáticos, que, tendo que buscar nos clássicos gregos muitas das idéias em geometria, em álgebra e em astronomia, as assimilou e desenvolveu, juntando-lhes novas características e novas idéias próprias. Os árabes haveriam, por sua vez, que assimilar e desenvolver tais idéias, transmitindo-as aos povos do ocidente, os quais, com novos métodos para a resolução dos problemas numéricos, produziram progressos na matemática, que, como nos tempos áureos da Grécia antiga, havia de reflorir e expandir-se.

A despeito das considerações precedentes há de se salientar (com relativa insistência) que, aproximadamente, do século V até o século XI a civilização na Europa Ocidental atingiu níveis muito baixos: o ensino praticamente deixou de existir, quase todo o saber grego desapareceu e muitas das artes e dos ofícios legados pelo mundo antigo foram esquecidos. Pode-se dizer que apenas os monges dos monastérios católicos e uns poucos leigos cultos preservaram um “pouco” o saber grego e latino. Além do mais, o período foi marcado por muita violência física e intensa fé religiosa. A ordem social antiga cedeu lugar a uma outra, feudal e eclesiástica.

Porém, se não tivesse existido Boécio, não haveria a “simbiose científica” entre o “mundo romano” e a “realidade escolástica”, e, certamente, o desenvolvimento não teria atingido o nível atual que experimentamos.

Carlos Magno Corrêa Dias
02/04/2013